quinta-feira, 27 de outubro de 2016

A Motivação e Satisfação no Serviço Público


Estudos realizados nos Estados Unidos e na Europa revelam que existem diferenças entre a motivação dos trabalhadores do sector público e do sector privado.
Perry (1996, in 2000:714), apresenta uma definição de Motivação para o Serviço Público: “… an individual’s preposition to respond to motives grounded primarily or uniquely in public institution and organizations.”

Segundo Houston (2000:714) os trabalhadores da Administração Pública são diferentes dos trabalhadores do sector privado. Para além dos trabalhadores “Public administrators are characterized by an ethic to serve the public, hence they are motivated by different job characteristics than are private-sector employees. In particular, workers in government organizations are seen as motivated by a concern for the community and a desire to serve the public interest”.

Ainda na ótica de Crewson (1997, in Houston 2000), a motivação para o serviço público pode ser caracterizada pela confiança das recompensas intrínsecas sobre as recompensas extrínsecas.

Perry e Wise (1990) argumentam que existiram pelo menos dois desenvolvimentos nos últimos anos, um intelectual e um prático, que vieram pôr em causa a força da ética no serviço púbico. Um deles é o surgimento da public choice, que é baseada num modelo de comportamento humano que assume que as pessoas são motivadas pelo interesse próprio. É, pois, natural a crescente popularidade dos sistemas de incentivo monetário, especialmente em níveis hierárquicos de topo organizacional.

Na perspetiva destes autores (1990:367)“Extrinsic rewards controlled by one’s supervisor are now seen as a major means for directing and reinforcing managerial and executive behavior. These related trends stand in opposition to the view that public service motives energize and direct the behavior of civil servants”.

Quadro 9: “Public Service Motives

Rational
Participation in the process of policy formulation.
Commitment to a public program because of personal identification.
Advocacy for a special or private interest.
 Norm-Based
A desire to serve the public interest.
Loyalty to duty and to the government as a whole.
Social equity.
 
Affective
Commitment to a program from a genuine conviction about its social importance.
Patriotism of benevolence”.
 

Fonte: Perry e Wise (1990:370)
 
Segundo Rocha (2010), inicialmente pensava-se que uma das únicas formas de motivar os trabalhadores era através dos incentivos económicos. Este autor não concorda afirmando ser uma atitude reducionista e com pouca aplicabilidade na Administração Pública, tendo em conta que o sistema de remunerações é estabelecido pela Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho (Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas)[1].

Pese embora, os salários não possam ser “manipulados” existem outras formas de motivar os trabalhadores da Administração Pública, segundo Rocha (2010) que passamos a apresentar:
    - Participação - a adoção de um estilo de liderança em que os trabalhadores ou funcionários[2]    sejam ouvidos e colaborem no processo de tomada de decisão;
   - Melhoria do trabalho - acrescentando responsabilidade, satisfazendo assim as necessidades mais elevadas na hierarquia de Maslow;
   - Ampliação de funções - aumentar o número de tarefas evitando a rotina no trabalho.
  - Adaptação dos trabalhadores às funções – para que as preferências e características individuais possam ser coincidentes com a função desempenhar, aumentando assim o interesse pelo trabalho;
   - Adequação da recompensa aos colaboradores - nem sempre a mesma recompensa tem o mesmo efeito em todas as pessoas;
   - As recompensas deverão ser adequadas ao nível de execução;
   - Adaptação dos objetivos e metas individuais à organização (quando possível).

Uma forma de melhorar o trabalho, ampliar as funções, adequar as remunerações ao justo trabalho do colaborador poderá ser através da modalidade de Mobilidade Interna, figura jurídica consagrada no artigo 92 º da Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho.

A mobilidade interna pode ser efetuada na categoria (dentro da mesma categoria para uma função diferente) ou entre carreiras, categoria superior ou de maior grau de complexidade (Garcia, 2009).

Para que esta possibilidade de recompensa, em vez de ser um fator de motivação passe a fator indutor de desmotivação é necessário que seja utilizado com parcimónia, transparência e acima de tudo justiça. Na ótica de Garcia (2009:54) “Seria desejável que os procedimentos de mobilidade se orientassem, de facto, por critérios de gestão racional dos serviços, sem coarctar as legítimas expectativas de realização profissional dos trabalhadores da Administração Pública…”.

Apesar de não ser a única forma de motivar os trabalhadores a recompensa monetária continua a ser um dos fatores mais importantes da motivação. A este respeito e devido à grave crise económica que Portugal atravessa, nomeadamente no que concerne à dívida pública que nos obriga a uma rigorosa contenção orçamental, existem grandes restrições introduzidas pelas sucessivas leis de execução orçamental.

Assim, não podem ser atribuídos prémios de desempenho, há grandes limitações em novas admissões na Administração Pública, impossibilidades de progressões na carreira, aumentos remuneratórios “congelados”, cortes remuneratórios, etc.

Sendo a satisfação um indicador da motivação e, seguindo mais uma vez a linha de pensamento de Francès (1984), é alcançada quando o trabalhador perceciona um equilíbrio entre aquilo que dá à organização e aquilo que recebe em troca (promoções, aumento de salário, entre outros), pensamos que os gestores deveriam, em especial em épocas de crise como a atual, dar relevância a outras formas de recompensa para que a satisfação e a motivação não sejam demasiado afetadas.

Rocha (2010) aponta como outra forma de recompensa, para além das atrás enumeradas, as recompensas formais e informais:

1.      As Recompensas Informais - Para além das recompensas monetárias, existem outras formas que contribuem para mostrar reconhecimento (e.g. medalha, diploma, referência no boletim da organização). Em organizações de importância pública ganha evidência o reconhecimento social (e.g. condecorações de personalidades que contribuem para a vida nacional).

2.      Recompensas Formais - Para que o sistema de recompensas funcione é preciso ter-se sempre presente:
       - Que as recompensas devem ajustar-se às necessidades das pessoas;
       - O sistema deve ser justo, isto é, igual para todos;
       - Deve destacar-se o valor a dar a uma recompensa, anunciando-se publicamente aqueles que recebem recompensas.

Acrescenta ainda que “Um dos problemas das organizações públicas é a apatia. Ora, em grande parte a eficiência de uma organização explica-se pelo nível de motivação”. Rocha (2010:114).

Como já referimos, na conjuntura atual não é fácil satisfazer as necessidades dos trabalhadores com compensações extrínsecas (aumento salarial, promoção, mobilidade e prémios de desempenho). Assim, consideramos de extrema importância que os gestores façam um diagnóstico à organização para perceber se existe satisfação/insatisfação, qual o seu grau e quais as áreas mais afetadas, para que, na posse desses dados, possam tomar medidas (caso necessárias) para que a produtividade/qualidade do serviço não sejam afetados, pelo absentismo, pela rotatividade ou pelo burnout.

Não podemos esquecer que as organizações, além de serem compostas de recursos materiais que visam finalidades específicas, são compostas, antes de mais, por pessoas. Pessoas que fazem parte de um projeto, para lidar com um público (clientes, utentes e/ou cidadãos), cada vez mais exigente.

Na gestão contemporânea, as organizações públicas devem alicerçar as decisões baseadas em diagnósticos atualizados da realidade social das instituições, que destaquem os pontos fortes e pontos fracos e que analisem as variáveis relevantes que contribuem para uma classificação ou melhor conhecimento da realidade existente.

A relação entre trabalhador e trabalho é complexa e ultrapassa o campo meramente profissional. A insatisfação das pessoas nas organizações se não for bem gerida, afeta negativamente o seu desempenho profissional, manifestando-se por várias formas, tais como: diminuição da produtividade, resistência passiva à mudança, degradação das relações interpessoais, aumento do absentismo, desmotivação de pessoal e outros indicadores que caracterizam a existência de mau clima organizacional.

Certos ambientes ou climas de trabalho negativos influenciam de uma forma clara a eficácia e a produtividade nessas organizações. Contrariamente, num bom ambiente de trabalho a ocorrência de um fator negativo pode ser ultrapassada sem inconvenientes de maior.

Porém, a ocorrência de fatores negativos, sendo decisivos e persistentes, podem não só afetar como transformar radicalmente ambientes de trabalho sãos e agradáveis. Mesmo que os fatores sejam externos à organização, não deixam de exercer inteiramente os seus efeitos, já que existe uma interação da organização com a componente externa do meio social envolvente.




[1] Em Portugal vigora um sistema de carreira, com um esquema estatutário.
[2] Segundo Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho poderemos considerar que existem na Administração Pública funcionários e trabalhadores. Os funcionários serão aqueles cuja relação jurídica é a de nomeação; os trabalhadores serão aqueles cuja relação jurídica é em regime de contrato em funções públicas.

terça-feira, 25 de outubro de 2016

Motivação

Na tentativa de maximização da produção, ao longo dos tempos, foram efectuados vários estudos sobre a gestão de pessoas. O reconhecimento da mais-valia, que constituem os recursos humanos nas organizações conduziu ao interesse em conhecer o que leva um ser humano a procurar um trabalho e a desempenhá-lo com maior ou menor eficiência.

Para que uma organização tenha sucesso, é necessário que os seus colaboradores estejam direccionados para o seu sucesso individual. Uma das tarefas da organização é fazer com que os esforços dos seus colaboradores, os seus sucessos individuais, estejam canalizados para a concretização dos objectivos da organização.

Ao longo da história muitas foram as teorias e os autores que se debruçaram sobre a temática da motivação no trabalho. Segundo Neves (1998:12) “Para compreender a performance dos indivíduos numa organização decorrente da motivação para o trabalho, é necessário fazer apelo aos modelos teóricos. Dado que a produtividade dos trabalhadores está intimamente associada à motivação …”

As teorias mais conhecidas sobre a motivação no trabalho encontram-se relacionadas com as necessidades humanas, de que é exemplo a teoria formulada por Abraham Maslow, que influenciam o comportamento humano: à medida que o Homem satisfaz as suas necessidades básicas, outras mais elevadas assumem o predomínio do seu comportamento.

A motivação não é um fenómeno intra-relacional, segundo Rocha (2010:104) “(…) resulta da interacção entre os indivíduos e as variáveis situacionais. Na Administração Pública a motivação ocorre em contexto diferente da do sector privado.”

Todos os indivíduos sentem essas necessidades, mas nem todos as sentem de uma forma idêntica. Cada um estabelece as suas prioridades, as suas metas e tem a sua própria maneira de agir e de pensar. Para além da personalidade de cada indivíduo, existem outros factores que influenciam a satisfação das necessidades humanas, tais como: factores sociais, culturais e profissionais.

Nuttin (1980:29) refere que (...) la motivation est au fond une question de relations préférentielles entre l’organisme (l’individu), d’une part, et le monde, de l’outre. Elle est l’aspect dynamique et directionnel du comportement qui établit, avec le monde, les relations “requises”.

Cada indivíduo é impulsionado pelos mais diversos motivos na satisfação das suas necessidades.

Rita Campos (1992:47) sustenta que a motivação no trabalho “ (…) se traduz no esforço que cada indivíduo desenvolve para desempenhar a sua função, contribuindo para a prossecução dos objectivos da empresa. Uma alta motivação traduz-se por:
           - interesse em ingressar numa empresa e permanecer nela;
           - desempenhar a função para a qual se é contratado duma forma responsável, integra e            criativa”.

Para Sekiou (in Ceitil 1993:89) “podemos entender por motivação uma força que impulsiona o indivíduo a procurar satisfazer as usas necessidades, os seus desejos, e que determina um comportamento visando reduzir um estado de tensão e assim estabelecer (ou restabelecer) um estado de equilíbrio”.

A nível organizacional, dentro das relações de trabalho numa organização, poderemos definir motivação como uma situação emocionalmente positiva que se produz num determinado sujeito quando existe um estímulo ou incentivo que lhe satisfaz uma necessidade, permitindo assim obter desse indivíduo um comportamento satisfatório.

Na vida diária, a motivação parece incluir um aspecto manipulador “ faz isto” e “dou-te isto que necessitas”. No entanto, quando falamos em termos organizacionais esta visão simplista e manipuladora não deverá existir. A motivação na organização só poderá surtir efeito tendo por base princípios como: o respeito pela dignidade do trabalhador e condições laborais e económicas ajustadas.

O Homem é um ser complexo. Por vezes os indivíduos trabalham por dinheiro, sendo esta uma das principais recompensas; todavia, ao longo do percurso profissional deixam de responder a um sistema de incentivo financeiro passando a dar prioridade a outros factores impulsionadores de motivação. Os trabalhadores anseiam por fazer uso das suas aptidões e demonstrar as suas capacidades; no entanto, nem sempre lhes são dadas essas possibilidades o que poderá ser uma fonte de desmotivação no seu trabalho.

Uma importante explicação para a variação que observamos no comportamento humano é a de que esses comportamentos são determinados por motivações que, para além de variarem de indivíduo para indivíduo, se alteram ao longo do tempo.

Os comportamentos humanos dependem, em larga medida, do contexto cultural, da situação familiar e de factores socioeconómicos. Por outras palavras, as (des)motivações são influenciadas, em grande parte, pela forma de perceber a situação em que nos encontramos.

Campos (1992) dá-nos uma explicação ao afirmar que existem factores que afectam a motivação no trabalho e que podem ser divididos em três categorias:
“Factores extrínsecos da função, que são todos os factores contextuais, como, por exemplo, as políticas de emprego, o estilo de liderança, os níveis de salário, a segurança de emprego; os factores intrínsecos que são aqueles que se relacionam com os atributos da função em si; e as características individuais de cada colaborador”. Campos (1992:47).
Segundo esta autora, se a um indivíduo que necessita de afecto, carinho ou consideração, apenas lhe for oferecido dinheiro, não o motivaremos. Mesmo que ele aceite esse dinheiro, isto poderá mesmo conduzir a uma situação de frustração para consigo mesmo e de agressividade para quem lho deu.

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

A Evolução da Gestão dos Recursos Humanos


A Gestão de Recursos Humanos existe desde que há pessoas organizadas para alcançar fins produtivos. No entanto há estudiosos que atribuem a sua origem ao Profeta Moisés, dizendo que foi este o primeiro a preocupar-se com a questão da organização de pessoas com fins produtivos.

Desde essa altura e até à Revolução Industrial, eram em número reduzido as organizações de grandes dimensões, encontrando-se sobretudo organizações artesanais, de cariz familiar, em que não havia a divisão do trabalho, os atritos eram escassos e a posição face ao outro ou à sociedade era definida e segura.

Chiavenato defende que em toda a sua longa história até ao início do século XX, a administração dos recursos humanos desenvolveu-se com uma lentidão impressionante[1]. Peretti é da mesma opinião de Chiavenato, afirmando que:

(...) a função quase não existia e os testemunhos são poucos. Através de alguns romances, é possível descobrir exemplos de práticas de Gestão de Recursos Humanos. Victor Hugo (Les misérables), a Condensa de Ségur (La Fortune de Gasporel), entre outros, descreveram práticas de contratação, despedimentos, formação, promoção e obras sociais[2].

Com a Revolução Industrial, a natureza do trabalho altera-se provocando um desequilíbrio no trabalho artesanal. Apareceram as grandes fábricas, em que as pessoas eram postas a trabalhar para que se obtivessem economias de escala, provocando uma deteorização das condições de trabalho da generalidade dos trabalhadores.

Nos finais do século XIX, para colmatar os inúmeros problemas humanos causados pela industrialização, cria-se o chamado Welfare Secretary nos Estados Unidos da América. Esta era uma função que salvaguardava as necessidades dos trabalhadores, prevenindo assim que se sindicalizassem.

Nas primeiras décadas do século XX, a organização científica promovida por Taylor vê as Welfare Secretaries serem substituídas pelos primitivos Departamentos de Pessoal que, contribuíram para melhorar a eficiência organizacional, mantendo os salários em níveis apropriados e tratando de certas injustiças sociais.

No período decorrido entre a primeira Guerra Mundial e os anos trinta, os Departamentos de Pessoal vão assumindo, cada vez mais, papéis importantes, tais como lidar com sindicatos, indemnizar e testar o pessoal recrutado.

Nas décadas de 40 e 50, com a popularização do modelo das Relações Humanas de Mayo, começam-se a valorizar os trabalhadores enquanto pessoas e os Departamentos de Pessoal continuam a aumentar de importância.

Peretti refere que na Europa, há o desenvolvimento das Leis sociais, o reforço dos sindicatos e as novas necessidades de gestão de pessoal (formação, recrutamento e aprendizagem) provocam, um pouco por todo o lado, o aparecimento de um homem ou de um serviço de pessoal[3].

Jean Fourastié afirma que a partir de 1945, começa um período de crescimento denominado “os trinta gloriosos”. Que se caracteriza por uma aplicação sistemática dos princípios de organização do trabalho – de simplificação do trabalho e dos próprios produtos – pela inovação das matérias e dos produtos, a subida do poder de compra, do nível de vida de consumo[4].

Nos anos 60 e 70, nos Estados Unidos, surgem importantes leis contra a discriminação sexual, racial e religiosa no trabalho, assim como leis que promovem melhor segurança e saúde no trabalho. Com estas medidas começa-se a sentir um progressivo crescimento da área de recursos humanos. Relembre-se que inicialmente a missão deste órgão era a de servir de amortecedor das insatisfações do pessoal, e ao mesmo tempo, um órgão técnico administrativo relativamente isolado da direção da empresa. Agora, passa a ter uma atividade contribuidora para a modernização constante das organizações como um todo.

É assim que evoluímos do termo Gestão de Pessoal para a Gestão de Recursos Humanos. A Gestão de Recursos Humanos, veio contribuir para uma maior criatividade, aprendizagem constante e motivação para o sucesso das empresas. Daí a Gestão de Recursos Humanos se ter tornado uma variável estratégica para o êxito da empresa.
 


[1] Chiavenato I., Op. Cit. pp. 39
[2] Chiavenato I., Op. Cit. pp. 30
[3] Peretti, J. M. (1997) Recursos Humanos. Lisboa: Edições Sílabo, pp. 33
[4] Cit in Peretti, J. M. Op. Cit. pp. 34
 
 

quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Desempenho Profissional e Produtividade


Ao longo dos tempos, como já referimos, muitos estudiosos se têm vindo a dedicar a esta temática. Podemos afirmar que a motivação e a satisfação serão no âmbito do comportamento organizacional dos temas mais estudados; contudo a quem deverá interessar verdadeiramente a falta de satisfação dentro das organizações, será aos seus líderes e às próprias organizações.

Um líder eficiente deverá ter a preocupação em analisar o comportamento dos seus colaboradores, pois só assim terá dados para poder tomar medidas, caso necessárias, na persecução da tão desejada e falada política dos três E’s (Economia, Eficácia e Eficiência).

O papel do gestor (líder) dentro de uma organização será o de conceber e levar à prática estratégias que façam com que os trabalhadores da organização aprendam e traduzam em ações sob a forma de comportamentos produtores de valor acrescentado, num contexto de trabalho o seu real potencial (Dias, 2007).

Para que um trabalhador sinta que o seu trabalho é relevante, é necessário que essa informação lhe seja transmitida pelos seus superiores hierárquicos. Nem sempre os gestores têm os colaboradores certos para as funções adequadas, especialmente na Administração Pública onde vigorou o “emprego para a vida”, em que as pessoas foram admitidas com baixas habilitações académicas. Com o aumento da idade da reforma e com a evolução tecnológica das últimas décadas, torna-se necessário manter estes trabalhadores aptos (reciclando-os através de formação profissional), auscultando as suas opiniões e dando-lhes feedback sobre a qualidade do seu trabalho. Com estes pequenos gestos, o gestor poderá contribuir para o aumento da satisfação do trabalhador.

Para que isto seja possível os gestores não devem apenas “… planearem, dirigirem e controlarem a realização do trabalho. Em simultâneo, têm que aprender a transformar o potencial dos seus colaboradores em competências úteis para a empresa, para si próprios enquanto hierarquias e para os colaboradores enquanto profissionais”. (Dias, 2007:24).

Embora não exista correlação empírica entre a satisfação e o desempenho organizacional, para os gestores o desempenho é visto como mais do que a produtividade abrangendo comportamentos próprios do papel e extra-papel que cada subordinado desempenha (Cunha et al., 2004).

Apesar desta inexistência de correlação, a maioria dos estudos indicam que os trabalhadores que melhor desempenham as suas funções e, consequentemente, recebem recompensas adequadas, têm níveis de satisfação elevados (Caldwell e O’Reilly, in Ferreira et al. 2001). No entanto, para Cunha et al. (2004:137) “… trabalhadores mais satisfeitos não são necessariamente os mais produtivos”.

Por outro lado, para os mesmos autores “Acresce que, mesmo os estudos denotativos de uma relação significativa positiva podem ser interpretados de um modo colidente com a lógica presumida (satisfação       desempenho).O que torna possível que a satisfação seja consequência e não causa do desempenho. (Cunha et al., 2004:137).

Isen & Baron (1991, in Cunha et al., 2004) apontam algumas justificações para a falta de correlação empírica clara entre satisfação e produtividade:
1)      As funções que os trabalhadores desempenham são tão estruturadas que, por vezes, não é possível achar variedade individual suficiente para que as diferenças interindividuais de satisfação originem diferenças de produtividade;
2)      As medidas objetivas de satisfação são normalmente formais (salário, estatuto). No entanto as medidas afetivas como o prazer também podem ter impacto sobre a produtividade;
3)      Este prazer pode manifestar-se por exemplo em maior criatividade, mas estes fatores não podem ser medidos em quantidade/qualidade da produção no curto prazo e estes resultados apenas são visíveis a longo prazo.

Fisher (1980:607) argumenta que “The lack consistent findings on the satisfaction/performance relationship is explained as an aggregation problem. I suggest that specific attitude measures should be related to the favorableness or unfavorableness of an individual’s total set of work-related behaviors”.

Contrariamente a estes estudos, trabalhos mais recentes como os de Staw e Barsade (1993 in Cunha et al., 2004:137) “…revelam a possibilidade de os trabalhadores mais satisfeitos serem também os mais produtivos”. Estes autores consideram que trabalhadores com conteúdos funcionais que abranjam tomadas de decisão ou relacionamento interpessoal têm melhores resultados quando têm maior grau de afetividade positiva[1].

Ainda dentro desta temática, Locke e Latham (1990b in Cunha et al., 2004) apresentaram um modelo mais abrangente integrando a motivação, a satisfação e a produtividade, designado como – Modelo do Ciclo de Elevado Desempenho. Este modelo inclui contribuições de várias teorias, nomeadamente, da teoria dos objetivos, das expectativas, da equidade e características do trabalho.

Na ideia destes autores este modelo consagra os seguintes conceitos:
  • “As pessoas são colocadas face a objectivos desafiantes;
·         Se estes objectivos forem acompanhados de elevada expectativa ou de um elevado sentimento de auto-eficácia, o resultado pode ser um desempenho elevado;
  • Para que tal aconteça, é todavia necessário que as pessoas estejam comprometidas com os objectivos, recebam feedback da actividade, detenham capacidades adequadas e não estejam enredadas em constrangimentos situacionais;
  • O elevado desempenho é propiciado por quatro mecanismos: direcção da atenção e da acção, esforço, persistência e desenvolvimento de estratégias e planos para a execução da tarefa;
  • Se for compensado e portanto compensador, o elevado desempenho conduz à satisfação com o trabalho;
  • A satisfação fomenta, por sua vez, o empenhamento com a organização e os seus objectivos.” (1990b in Cunha et al., 2004:138)


Embora haja alguma contradição e falta de fundamentação no que concerne à correlação entre produtividade e satisfação, atrevemo-nos a concordar com esta perspetiva de Locke e Latham, onde bons desempenhos estão associados a recompensas positivas, monetárias, progressão na carreira ou autorrealização. Este tipo de recompensas gera no trabalhador satisfação com o seu trabalho aumentando a sua lealdade à organização e identificação com os seus objetivos, fazendo com que o seu desempenho seja mais eficaz.
 


[1]As pessoas com elevados níveis de afectividade positiva podem ser descritas como excitadas, entusiásticas, activas, fortes e animadas/vivas. (…) Vêem-se igualmente como eficazes, e tendem a experienciar emoções positivas e estados de humor agradáveis. As detentoras de baixos níveis podem ser descritas como modorrentas , lerdas, vagarosas. Não se sentem agradáveis, nem auto-eficazes, e têm um fraco sentido de bem-estar geral”. (Cunha et al., 2004:137).



Lina Nunes

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

Modelos de Gestão de Recursos Humanos (GRH) nos Sectores Públicos e Privados


A partir dos anos oitenta começaram a emergir medidas relativas à reforma da Administração Pública. De acordo com Carapeto et al. (2005), estas reformas “foram marcadas pela aproximação da gestão da função pública à do sector privado…”, visando a modernização administrativa.

Com a Nova Gestão Pública assistimos a uma diminuição gradual da intervenção do Estado. Verificamos alguma desintervenção Estatal, mesmo em áreas sociais, privilegiando-se as privatizações e as parcerias público-privadas. A concorrência, a racionalização económica e a relevância dada aos outputs, métodos usualmente utilizados na gestão privada, passaram a fazer parte do quotidiano da gestão no sector público.

Para tornar a Administração Pública mais eficiente e eficaz foi necessário reformar e modernizar a administração, tendo como objetivos melhorar a qualidade dos serviços e aproximar-se mais dos cidadãos.

A GRH não ficou alheada deste processo. O facto da Administração Pública se reger por um “modelo estatutário da Função Pública, o excesso de garantias dos funcionários, e a rigidez dos instrumentos disponíveis, tem colocado dificuldades na gestão dos recursos humanos nomeadamente no que concerne à aplicação de novos instrumentos, como a avaliação de desempenho, a mobilidade de pessoal e a introdução de mudanças no comportamento das pessoas” (Araújo, 2005:6). Apesar das dificuldades foram importados procedimentos do sector privado e aplicados ao sector público, visando uma clara aproximação dos dois sectores.

A diferença entre a gestão pública e a gestão privada “radica no contexto político em que ambas operam”. (Bilhim, 2009:119). Mais importante que a importação de medidas do sector privado, Rocha (1995) salienta as diferenças existentes entre os dois sectores, considerando-as mais importantes do que as semelhanças, nomeadamente:
       - A oposição existente entre o interesse público (sector público) e o lucro (sector privado);
       - Obrigações legais inerentes à gestão pública;
       - Ambiente político (gestão pública);
       - Ênfase no cumprimento de normas (público) e não nos resultados (Privado);
       - Oportunidade política é superior aos critérios de eficácia e eficiência;
       - Relações de poder com diferença inalteráveis;
       - Padrões organizacionais distintos;
       - Financiamento dos impostos (público) e não dos consumidores (privado;
       - Concorrência (privado) e monopólio (público); e
       - Dificuldade em apurar custos das actividades.

Nesta linha de pensamento Willcocks e Harrow (1992), procuraram distinguir os serviços públicos do sector privado, tal como podemos observar no quadro que se segue.

Quadro 1: Algumas Diferenças entre o Sector Público e o Sector Privado

Serviços Públicos
Sector privado
1.     Regulamentação; códigos de conduta
 
2.     Necessidades provindas da gestão da economia nacional
3.     Relativa transparência da administração e da tomada de decisão; ênfase sobre os representantes
4.     Público atento; uma base ampla de stakeholders; impacto de corpos regulamentares e subsidiários
5.     Múltiplos valores e objetivos:
·  Serviço
·  Interesse público
·  Equidade
·  Profissionalismo
·  Participação do utente
·  Trade-offs complexos
6.     Fonte principal de recursos: impostos
 
7.     Ampla responsabilidade
8.     Dar resposta às orientações políticas e aos horizontes (de curto prazo)
9.     Objetivos sociais primordiais, ex., segurança, saúde, educação…
10. Indicadores de desempenho complexos e discutíveis
11. Diretivas políticas mais mal definidas: complexidade na implementação dessas políticas
1.         Conselho de administração; enquadramento condicionado pelo planeamento da empresa
2.         Indicadores de mercado
 
3.         Relativo secretismo; ênfase sobre a confidencialidade do negócio
4.         Foco primordial nos acionistas e na gestão
 
 
5.         Valores e objetivos relativamente restritos
 
 
 
 
 
 
 
 
6.         Fonte principal de recursos; receitas operacionais e empréstimos
7.         Responsabilidade restrita
8.         Não há real sobreposição política nacional/local; menos constrangimentos artificiais em tempo
9.         Objetivo primordial: lucro
 
10.      Sobretudo medidas quantitativas de carácter financeiro
11.      Políticas relativamente menos ambíguas
 

Fonte: Adapatado de Willcocks e Harrow (1992), in Carvalho (2001:64)

Existem consideráveis críticas à tentativa de igualar a gestão pública à gestão privada, Walsh (1992, in Boyne 1999) aponta que ao adotar no sector público uma linguagem pertencente ao sector privado correr-se-á o risco deste sector perder ou negligenciar valores inerentes ao seu domínio.

A razão para se mudar a forma de gestão dos recursos humanos no sector público, segundo OCDE, 1996 (in Boyne, 1999) foi similar nos diversos países que fazem parte da OCDE. A tensão económica no sector público aumentou a necessidade de uma maior eficiência e de um aumento na qualidade dos serviços prestados, acompanhados por uma redução do número de trabalhadores.

Em Portugal, a introdução de medidas típicas do sector privado no sector público, são uma realidade. Assim, no que concerne à GRH, foram introduzidas um conjunto de reformas que foram alterando progressivamente o “estatuto” de funcionário público.

Foram vários os diplomas que introduziram mudanças no sistema de carreira, nos métodos e procedimentos de recrutamento, no sistema retributivo e na promoção da mobilidade de pessoal. Estas medidas foram importando modelos aplicados no sector privado e a racionalização do sistema de pessoal

Uma das medidas que espelha a necessidade de flexibilizar a gestão de pessoal na Administração Pública é a introdução do regime do contrato individual de trabalho, o que adota regras de direito comum à Administração Pública (Lei nº 23/2004).

Nos últimos vinte e cinco anos, segundo Horton (2006) o desempenho do sector público assumiu uma nova urgência e tem preocupado todos os países da OCDE. As razões para esta preocupação são bem conhecidas - a necessidade dos governos assegurarem a utilização eficiente e eficaz dos recursos públicos. Esta preocupação resulta da pressão para reduzir ou controlar a despesa pública. Crescem cada vez mais as expectativas de melhores serviços públicos efetuados por funcionários competentes. A exposição de muitas organizações públicas à competição com o sector privado e voluntário, oferecendo os mesmos serviços, favorece o processo comparativo e o aumento das exigências do utente.

Independentemente de uma maior ou menor aproximação ao sector privado, a Administração Pública continuará a ter especificidades incomparáveis ao sector privado. O importante é que a Administração continue com o seu sentido de missão, que continue a servir cidadãos e não clientes. Para tal, é necessário que se valorize a prestação de contas, a responsabilidade pelos bens públicos, a ideia de serviço público, sobre tudo a cidadania.

Os recursos humanos têm um papel fundamental na persecução deste objetivo. Deste modo, é essencial que a Administração Pública mantenha os seus trabalhadores aptos a servir os cidadãos, com eficácia, economia e eficiência. A formação profissional tem um papel central na otimização dos recursos humanos, dotando-os de maiores aptidões e competências para o desempenho das suas funções.

Os gestores públicos não se podem esquecer que estão a lidar com recursos humanos e não com matérias-primas e que estes são a “cara” da Administração Pública, são eles que lidam diretamente com o cidadão, trabalhadores motivados produzem mais e melhor.

Lina Nunes