quarta-feira, 19 de outubro de 2016

Modelos de Gestão de Recursos Humanos (GRH) nos Sectores Públicos e Privados


A partir dos anos oitenta começaram a emergir medidas relativas à reforma da Administração Pública. De acordo com Carapeto et al. (2005), estas reformas “foram marcadas pela aproximação da gestão da função pública à do sector privado…”, visando a modernização administrativa.

Com a Nova Gestão Pública assistimos a uma diminuição gradual da intervenção do Estado. Verificamos alguma desintervenção Estatal, mesmo em áreas sociais, privilegiando-se as privatizações e as parcerias público-privadas. A concorrência, a racionalização económica e a relevância dada aos outputs, métodos usualmente utilizados na gestão privada, passaram a fazer parte do quotidiano da gestão no sector público.

Para tornar a Administração Pública mais eficiente e eficaz foi necessário reformar e modernizar a administração, tendo como objetivos melhorar a qualidade dos serviços e aproximar-se mais dos cidadãos.

A GRH não ficou alheada deste processo. O facto da Administração Pública se reger por um “modelo estatutário da Função Pública, o excesso de garantias dos funcionários, e a rigidez dos instrumentos disponíveis, tem colocado dificuldades na gestão dos recursos humanos nomeadamente no que concerne à aplicação de novos instrumentos, como a avaliação de desempenho, a mobilidade de pessoal e a introdução de mudanças no comportamento das pessoas” (Araújo, 2005:6). Apesar das dificuldades foram importados procedimentos do sector privado e aplicados ao sector público, visando uma clara aproximação dos dois sectores.

A diferença entre a gestão pública e a gestão privada “radica no contexto político em que ambas operam”. (Bilhim, 2009:119). Mais importante que a importação de medidas do sector privado, Rocha (1995) salienta as diferenças existentes entre os dois sectores, considerando-as mais importantes do que as semelhanças, nomeadamente:
       - A oposição existente entre o interesse público (sector público) e o lucro (sector privado);
       - Obrigações legais inerentes à gestão pública;
       - Ambiente político (gestão pública);
       - Ênfase no cumprimento de normas (público) e não nos resultados (Privado);
       - Oportunidade política é superior aos critérios de eficácia e eficiência;
       - Relações de poder com diferença inalteráveis;
       - Padrões organizacionais distintos;
       - Financiamento dos impostos (público) e não dos consumidores (privado;
       - Concorrência (privado) e monopólio (público); e
       - Dificuldade em apurar custos das actividades.

Nesta linha de pensamento Willcocks e Harrow (1992), procuraram distinguir os serviços públicos do sector privado, tal como podemos observar no quadro que se segue.

Quadro 1: Algumas Diferenças entre o Sector Público e o Sector Privado

Serviços Públicos
Sector privado
1.     Regulamentação; códigos de conduta
 
2.     Necessidades provindas da gestão da economia nacional
3.     Relativa transparência da administração e da tomada de decisão; ênfase sobre os representantes
4.     Público atento; uma base ampla de stakeholders; impacto de corpos regulamentares e subsidiários
5.     Múltiplos valores e objetivos:
·  Serviço
·  Interesse público
·  Equidade
·  Profissionalismo
·  Participação do utente
·  Trade-offs complexos
6.     Fonte principal de recursos: impostos
 
7.     Ampla responsabilidade
8.     Dar resposta às orientações políticas e aos horizontes (de curto prazo)
9.     Objetivos sociais primordiais, ex., segurança, saúde, educação…
10. Indicadores de desempenho complexos e discutíveis
11. Diretivas políticas mais mal definidas: complexidade na implementação dessas políticas
1.         Conselho de administração; enquadramento condicionado pelo planeamento da empresa
2.         Indicadores de mercado
 
3.         Relativo secretismo; ênfase sobre a confidencialidade do negócio
4.         Foco primordial nos acionistas e na gestão
 
 
5.         Valores e objetivos relativamente restritos
 
 
 
 
 
 
 
 
6.         Fonte principal de recursos; receitas operacionais e empréstimos
7.         Responsabilidade restrita
8.         Não há real sobreposição política nacional/local; menos constrangimentos artificiais em tempo
9.         Objetivo primordial: lucro
 
10.      Sobretudo medidas quantitativas de carácter financeiro
11.      Políticas relativamente menos ambíguas
 

Fonte: Adapatado de Willcocks e Harrow (1992), in Carvalho (2001:64)

Existem consideráveis críticas à tentativa de igualar a gestão pública à gestão privada, Walsh (1992, in Boyne 1999) aponta que ao adotar no sector público uma linguagem pertencente ao sector privado correr-se-á o risco deste sector perder ou negligenciar valores inerentes ao seu domínio.

A razão para se mudar a forma de gestão dos recursos humanos no sector público, segundo OCDE, 1996 (in Boyne, 1999) foi similar nos diversos países que fazem parte da OCDE. A tensão económica no sector público aumentou a necessidade de uma maior eficiência e de um aumento na qualidade dos serviços prestados, acompanhados por uma redução do número de trabalhadores.

Em Portugal, a introdução de medidas típicas do sector privado no sector público, são uma realidade. Assim, no que concerne à GRH, foram introduzidas um conjunto de reformas que foram alterando progressivamente o “estatuto” de funcionário público.

Foram vários os diplomas que introduziram mudanças no sistema de carreira, nos métodos e procedimentos de recrutamento, no sistema retributivo e na promoção da mobilidade de pessoal. Estas medidas foram importando modelos aplicados no sector privado e a racionalização do sistema de pessoal

Uma das medidas que espelha a necessidade de flexibilizar a gestão de pessoal na Administração Pública é a introdução do regime do contrato individual de trabalho, o que adota regras de direito comum à Administração Pública (Lei nº 23/2004).

Nos últimos vinte e cinco anos, segundo Horton (2006) o desempenho do sector público assumiu uma nova urgência e tem preocupado todos os países da OCDE. As razões para esta preocupação são bem conhecidas - a necessidade dos governos assegurarem a utilização eficiente e eficaz dos recursos públicos. Esta preocupação resulta da pressão para reduzir ou controlar a despesa pública. Crescem cada vez mais as expectativas de melhores serviços públicos efetuados por funcionários competentes. A exposição de muitas organizações públicas à competição com o sector privado e voluntário, oferecendo os mesmos serviços, favorece o processo comparativo e o aumento das exigências do utente.

Independentemente de uma maior ou menor aproximação ao sector privado, a Administração Pública continuará a ter especificidades incomparáveis ao sector privado. O importante é que a Administração continue com o seu sentido de missão, que continue a servir cidadãos e não clientes. Para tal, é necessário que se valorize a prestação de contas, a responsabilidade pelos bens públicos, a ideia de serviço público, sobre tudo a cidadania.

Os recursos humanos têm um papel fundamental na persecução deste objetivo. Deste modo, é essencial que a Administração Pública mantenha os seus trabalhadores aptos a servir os cidadãos, com eficácia, economia e eficiência. A formação profissional tem um papel central na otimização dos recursos humanos, dotando-os de maiores aptidões e competências para o desempenho das suas funções.

Os gestores públicos não se podem esquecer que estão a lidar com recursos humanos e não com matérias-primas e que estes são a “cara” da Administração Pública, são eles que lidam diretamente com o cidadão, trabalhadores motivados produzem mais e melhor.

Lina Nunes

 

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